Uma máscara facial desenvolvida por engenheiros da Universidade Harvard e do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) pode indicar se seu usuário está contaminado com o Sars-Cov-2. O diagnóstico sai em 90 minutos, relata trabalho publicado nesta segunda (28) na revista Nature Biotechnology.
No novo teste, biossensores minúsculos são liofilizados, ou seja, desidratados por um método que congela a vácuo e depois retira a água congelada por sublimação (direto do estado sólido para o de vapor). Essa técnica conserva o material estável por muitos meses.
Os sensores liofilizados são então incorporados à parte interna de máscaras de papel, para detectar partículas virais em seu hálito e respiração. Quando o usuário está pronto para fazer o teste, ele aciona um botão que libera água no material, reidratando e reativando os biossensores, que são capazes de detectar material genético do coronavírus.
O resultado aparece de forma semelhante ao de um teste doméstico de gravidez: uma linha de controle e uma segunda linha que, se estiver preenchida, indica contaminação. Como o resultado só é visível no lado interno da máscara, a privacidade do paciente é resguardada.
O teste é tão sensível quanto o padrão ouro, PCR, mas é tão rápido quanto os testes de antígenos, diz um dos líderes do estudo, Peter Nguyen, do Wyss Institute for Biological Inspired Engineering de Harvard. “Essencialmente, reduzimos todo um laboratório de diagnóstico a um pequeno sensor que funciona com qualquer máscara facial e combina alta precisão com velocidade e baixo custo”, afirmou Nguyen.
Os pesquisadores entraram com o pedido de patente da tecnologia e pretendem ver o produto desenvolvido e vendido por empresas. “Já tivemos muito interesse de grupos externos que gostariam de usar os esforços de protótipo que temos e levá-los a um produto aprovado e comercializado”, diz James Collins, professor de engenharia médica e ciência do MIT.
Collins começou a trabalhar na tecnologia que resultou na máscara em 2014, quando demonstrou que era possível extrair a “maquinaria” molecular usada pelas células para detectar moléculas de RNA derivadas de patógenos, liofilizá-la e acoplá-la a uma proteína que indica a detecção, mudando de cor ou ficando fluorescente.
Esse “circuito genético” foi acoplado em papel, o que permite um diagnóstico barato, preciso e portátil. Collins usou essa abordagem para criar diagnósticos para os patógenos que causam Ebola e Zika.
Em 2017, ele avançou a pesquisa e criou um método baseado em enzimas, que chamou de sensores Sherlock, para detectar com muita sensibilidade ácidos nucleicos (RNA ou DNA, que formam o material genético).
Quando ativados pela água, esses sensores liofilizados interagem com sua molécula alvo, que pode ser qualquer sequência de RNA ou DNA ou outros tipos de moléculas, e produz um sinal, como a mudança na cor nas tiras de testes de gravidez.
Numa segunda etapa, Collins, Nguyen e Luis Soenksen, que pesquisa aprendizado de máquina em saúde para a Clínica Abdul Latif Jameel do MIT, passaram a testar os melhores tecidos para a incorporação desses sensores, para criar diagnósticos vestíveis.
“Essas técnicas exigiam colocar células vivas no próprio vestível, como se o usuário estivesse usando um aquário minúsculo. Se o aquário quebrasse, o vazamento poderia chegar ao usuário, e ninguém gosta dessa ideia “, disse Nguyen. Os pesquisadores passaram a testar metodicamente mais de cem tipos diferentes de tecidos.
Estavam no final do estudo quando a Covid-19 começou a se espalhar pelo mundo, no começo de 2020. Decidiram então usar sua tecnologia para criar rapidamente a máscara de diagnóstico para o Sars-Cov-2.
Todo o projeto foi feito em quarentena ou distanciamento social estrito a partir de maio de 2020. “Trabalhamos em casa, às vezes trazendo equipamentos não biológicos e montando dispositivos manualmente. Era definitivamente diferente da infraestrutura de laboratório normal com a qual estamos acostumados, conseguimos garantir que os sensores funcionassem de verdade”, relata Soenksen.
Na máscara de diagnóstico, acontecem três diferentes reações biológicas. A primeira abre a membrana do vírus Sars-CoV-2, se ele estiver presente na respiração do usuário, e expõe seu RNA. A segunda faz várias cópias do gene que codifica a proteína S, usada pelo coronavírus para penetrar nas células. A reação final, usando sensores Sherlock, detecta qualquer fragmento do gene S e, neste caso, corta uma molécula “detectora” em dois pedaços menores que mudam as cores da tira de ensaio.
Em seu trabalho preliminar a equipe produziu também o protótipo de uma jaqueta com cerca de 30 desses sensores incorporados em uma combinação de poliéster e outras fibras sintéticas, mistura muito usada na indústria da moda, que deu o melhor resultado nos testes, diz Soenksen.
Os reagentes ficam numa área pequena, circunscrita por um anel que impede que a amostra evapore ou se espalhe pela tela, na parte externa da roupa. Quando respingada com um líquido contendo partículas de vírus, como se fossem gotas de saliva de um paciente contaminado, seus sensores reagem.
O resultado pode aparecer como cores visíveis a olho nu ou, de acordo com a programação, sinais fluorescentes que são detectados por espectrômetro portátil (semelhante ao usado por peritos em filmes policiais, para identificar vestígios de sangue).
Também foi projetado um espectrômetro que pode ser integrado ao tecido. O aparelho lê na própria roupa os resultados e os transmite para um dispositivo móvel. “Isso permite monitorar à distância a exposição ambiental de uma pessoa, além de marcar o local em que ela ocorreu e avisar seu usuário”, diz Nguyen.
A jaqueta foi testada com sensores para Sars-Cov-2, influenza, Ebola e Zika e para substâncias químicas ou tóxicas como os organofosforados, compostos usados em agrotóxicos, que podem atacar o sistema nervoso.
“Esta tecnologia pode ser incorporada em aventais de laboratório para cientistas que trabalham com materiais perigosos ou patógenos, blusas para médicos e enfermeiras ou uniformes de socorristas e militares que podem ser expostos a patógenos perigosos ou toxinas, como gás nervoso”, disse co-autora Nina Donghia, cientista da equipe do Wyss.
A Agência de Redução de Ameaças de Defesa, do governo americano, foi uma das instituições que financiou a pesquisa, ao lado do setor de inovação da Johnson e Johnson, do Grupo de Fronteiras Paul G. Allen, de institutos e fudações ligados a Harvard e ao MIT. Por FolhaPress
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